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Alguém Mordeu o Planeta

Era uma vez um planeta dentado, como se fosse comer ou como se o tivessem comido.

 

Ninguém sabia se alguém lhe tinha dado uma dentada ou se, por outra, usava dentadura.

 

Durante longos anos, os investigadores do planeta estudaram, analisaram, mediram e até viraram o planeta do avesso, para que se percebesse a origem e o propósito da dentada. Ou da dentadura.

 

Nas escolas, os professores pediam às crianças que ajudassem os estudiosos nas suas pesquisas.

 

Todos tentavam adivinhar, com grande seriedade e empenho, o que poderia ser a dentada. Ou a dentadura.

“Pode ter sido um dragão nervoso!”, adiantou um.

“Ou um bicho das maçãs!”, sugeriu outro.

“É bem possível que o universo seja habitado por um gigante que come planetas!”, atreveu-se outro ainda.

“Talvez estejamos todos dentro de um berlinde rachado!”. Este pensou fora da caixa. Isto é, dentro.

“Com a força do gigante, é bem possível!”, disseram todos.

Os investigadores foram inquirir os moradores do planeta que estavam mais próximos da dentada. Ou da dentadura.

Não tinham notado nada estranho.

E também não se lembravam se existia ali algum outro país que tivesse sido comido.

 

Enquanto as investigações prosseguiam, os organizadores do planeta entenderam que era preciso encurtar a distância entre o lado de cá e o lado de lá da dentada (ainda que pudesse ser uma dentadura).

Encomendaram o serviço aos engenheiros e construtores do planeta.

Foi montada, então, uma ponte muito segura, muito direita e que encaixou perfeitamente nos encalços preparados tanto do lado de cá, como do lado de lá da dentada. Ou da dentadura.

 

Certo dia, ouviu-se um barulho muito forte. Parecia trovoada, mas não podia ser, pois todos colocaram as palmas das mãos para cima e elas não ficaram molhadas.

 

Os investigadores, os professores, as crianças, os organizadores, os engenheiros e os construtores (e também os moradores que não faziam coisa nenhuma) olharam para o lado, a ver se viam um dragão, um bicho ou um gigante. Mas nada apareceu e nada viram.

 

Enquanto se resignavam a mais um evento de origem suspeita, mas desconhecida, o planeta abriu a boca.

 

Era afinal uma dentadura!

 

“Ooooh….”, exclamaram todos.

 

Com sorte, o planeta conteve-se e não bocejou. Abriu só um pouco a boca, do tamanho assim de um dente – dos da boca do planeta, claro.

Mas os engenheiros que projetaram a ponte que os construtores montaram haviam admitido a hipótese de a dentada poder ser uma dentadura. À cautela, fizeram-na, por isso, elástica.

 

Os que lá iam a passar só sentiram, assim, uns tombos e ninguém caiu na boca do planeta.

 

“Ufa….”, disseram todos de mão ao peito.

Sabe-se lá se não poderiam ter sido engolidos e saíam mais tarde do outro lado do planeta.

 

Como seria natural, porque pessoas não são coisas boas para um planeta comer…

 

Como os moradores bem sabiam o que fazia bem à barriga do planeta, começaram a tratar da terra na boca dele, regando-a e plantando-a.

 

O planeta terá gostado, porque não achou que fosse preciso voltar a abrir a boca.

 

Para além disso, começou a ficar mais gordo, anafado e de boca cheia.

 

De tal modo que, passados alguns anos, mal se percebia que havia usado dentadura.

 

Os moradores do planeta consideraram que era, então, altura de lhe mudar o nome.

 

É que já não parecia que alguém pudesse tê-lo mordido. Parecia-se, antes, com um feijão!

 

Mas os moradores do planeta já estavam cansados de tanto estudar. Para além disso, até tinham acompanhado o planeta até se parecer com um feijão.

 

Não havia, para eles, nenhuma novidade nisso.

 

Por esse motivo, resolveram, em alternativa, deixar que os próximos moradores do planeta, caso venham a esquecer-se de como ali chegaram, se entendam com esse assunto.

 

De qualquer modo, por cortesia, deixaram um bilhete, à porta da cova do feijão, onde inscreveram: 

«Este feijão já foi uma dentadura e não parece que o gigante que viva no universo jogue ao berlinde.»

 

E terminaram, escrevendo:

«Caso montem uma ponte por cima do olho do feijão, pelo sim, pelo não, é melhor que seja elástica!»

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